segunda-feira, 15 de março de 2010

"Bibliotecas e, entre elas, a minha..."


Não é a minha de Montemor...

A minha é um pouco pior em matéria de [des] organização, confesso...

Praticamente todos os dias juro a mim mesmo que vou recatalogar tudo, digitalizar o catálogo, separar os géneros, pôr os DVDs e os videos em estantes separadas por realizadores e separadas dos livros e estes dos CDs e, todos os dias, renuncio, intimidado pela amplitude verdadeiramente homérica, ciclópica, da tarefa...

Acho, aliás, que fundo, o encanto das bibliotecas vem, em última instância, daí, do prazer, da íntima vibração de uma desordem cultivada para ser apenas nossa e onde, precisamente, todo o prazer pode florescer porque completamente livre da opressão do dever, na forma de uma ordem imposta que inevitavelmente a impediria de respirar----e a mim, também...

Delicio-me, confesso, com o ar perplexo [e invariavelmente um pouco desconfiado, também!...] do homem da luz ou da água que entra e se depara, de imediato, com estantes e estantes povoadas de velhos [e aromáticos!] "bouquins" reunidos ao longo de uma vida inteira---venezianos palavrosos e mediterrânicos, imensamente álacres e carnais, parisienses sombrios e sóbrios, castelhanos irrequietos cheirando a ervas e ao sol onde foram gerados---todos eles ali sucessivamente depostos na mais deliciosa das desordens---das "insurgências espaciais", vibrantemente a-geométricos, a única ordem que aceitam, eles e eu---uma cidade de papel e ideias onde coexistem em intermináveis e íntimas cavaqueiras às quais faço absoluta questão de regularmente comparecer [como nos antigos cafés de Lisboa onde ao serão os amigos se reuniam para celebrar a Amizade entre cigarros e bicas cumplicemente parilhados] esses inestimáveis amigos de inteligência e tinta sem os quais não saberia viver...

Ordem?

Eu tenho a minha que é também a deles---que é a nossa!---e se ma tirassem acho que, no dias seguinte, morria...

"Arrumar aquilo", dizem-me?

Mas... aquilo está arrumado!

Como as aves nos respectivos voos, as paisagens nas respectivas cores e cheiros e os rios na sua incomparável e perfeita liquidez!

"Arrumar a perfeição"!??!!

Vinha o próprio Deus em pessoa e desarrumava tudo outra vez...

Deus... ESSE sabe de que é que eu estou a falar...


[Imagem ilustrativa "gentilmente cedida" pela Livraria Casa das Letras via «Facebook»]

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