Paris...
Um dos encantos de Paris [que é um dos seus melhores e mais fascinantes "mistérios", também...] está nas mágicas, aparentemente insondáveis escadarias dos bairros populares, de longos e invulgarmente tácteis corrimãos de ferro polido pelo uso, em alguns casos secular, conduzindo nunca se sabe exactamente onde e que Lisboa [ou Liège, por exemplo---lembro-me, especialmente, de uma dessas imensas escadarias conduzindo a uma 'pequena Montmartre' 'liégeoise", encarrapitada numa colina íngreme, marginal e prodigiosamente silenciosa, de janelas cerradas envoltas num silêncio quase surreal] copiaram e integraram na sua própria fisionomia [e, a meu ver, na sua identidade] urbanas.
Recordo, com especial voluptuosidade, os corrimãos de metal vidrado pelo uso, quasi-esculturas que apetece percorrer com os dedos e a palma da mão com a sensualidade que usaríamos para percorrer a anca ou o dorso de um corpo humano completamente nu de muitas dessas escaradarias na sua 'versão' lisboeta, como as que do Martim Moniz [junto ao antigo "Piolho"] conduz directamente à parte alta da velha Mouraria ou uma outra, ainda mais recôndita que, pertinho já da "minha" Graça de deslumbradas e quase iniciáticas primeiras errâncias solitárias de adolescente, leva da Damasceno Monteiro ao Miradouro.
Quantas vezes, ganha coragem para me evadir da "prisão" do velho "Gil", aí esperei ansiosamente pelas 15 horas para que o não menos velho "Royal" abrisse as portas e eu aí me pudesse refugiar durante as duas horas e pico que durava a matiné, às voltas com Bogarts, Erroll Flynns, Joan Fontaines e/ou Lauren Baccalls e Cary Grants...
Para o adolescente deslumbrado que fui, as escadas conduziam directamente... ao céu desses prazeres [literalmente] proibidos, ousdadamente roubados a um liceu que lá era à época sinónimo de repressão e terrores de toda a espécie...
Lindíssima foto ! Lindíssimas escadas, que eu associo mais a Lisboa, porque conheço mal as de Paris. Escadas que nos levam para o cimo, das cidades ou dos sonhos !
ResponderEliminarUm beijo, Carlos!
Lindíssima, de facto, Ana!
ResponderEliminarTambém eu conheço [e sinto!] apesar de tudo, melhor, as de Lisboa---as que citei e tantas outras, como as do Duque onde tantas vezes me refugiei e pelas quais errei sem destino, num deslumbramento "lisboético" ou "lis-poético" nunca satisfeito nem saciado...
Muitas vezes, saído da escola, vindo de Almada, me perdi, frequentemente até de noite, por aqui ou pelas que vão da Damasceno Monteiro até à Graça, só pelo prazer de "sentir Lisboa" à luz mortiça dos candeeiros reflectida nestas escadas mágicas da cidade!...
Ainda hoje, aliás, faço isso!
São, aliás, estas escadas que eu "vejo" quando oiço o António dos Santos [também está no "Tube"...] cantar Lisboa...
Beijinho e, se puderes, ouve o António dos Santos, uma das pessoas que melhor canta e sente---vive!---a Cidade...
Carlos