Oriundo de uma região pobre e comparativamente subdesenvolvida de Itália, Nápoles, Tótó, o Principe Antonio Focas Flavio Angelo Ducas Comneno De Curtis Di Bisanzio Gaglardi consagrou um paradigma de comicidade "débrouillarde" e pícara, muito característica, onde a matriz sócio-económica, profundamente deprimida, actua como o próprio fundamento objectivo, histórico, social e político, da comicidade.
É nela, nessa matriz histórica precisa, que a comédia ancora: é por ela que o cinema se une ao real, mesmo quando o não põe [ou parece não pôr] imediata e directamente em causa e em questão.
A fome, a miséria, a necessidade permanente---e ingente---de "arranggiarsi" ["Arranggiatevi!"/"Desenrasquem-se!" é o título de um dos seus inúmeros filmes, à época, aliás, muito populares também entre nós] está invariavelmente presente nos filmes por ele protagonizados e encontra alguma evidente analogia [a começar pela que existe entre o tipo de condicionantes económicas, sociais e mesmo políticas gerais, entre a realidade económica, social e política italiana do sul e a portuguesa dos anos '20, '30 e '40] com algum cinema português---a famosa "comédia" dita "à portuguesa" onde António Silva, por exemplo, surge como uma das grandes referências e possível ou potencial émulo local.
Relativamente menorizado à época, Tótó seria "recuperado", por assim dizer, por grandes e consagrados cineastas como Rossellini ou Pasolini mas, em meu entender, pelo menos, onde ele atinge as culminâncias do seu 'boneco' e dele tira todo o partido quer de técnica, quer de crítica social implícita ou mesmo expressa é com Moniccelli que o entende às mil maravilhas sem o intelectualizar demasiado, por exemplo, em "Guardia e Ladro", uma comédia fabulosa e fabulosamente crítica [como digo noutro lugar: perfeitamente à altura, em registo de comédia, do que de melhor e de mais definitivo fez, noutro registo mais "a sério", no neo-realismo italiano de Rossellini a Visconti, do 'primeiro Fellini' ao igualmente 'primeiro De Sica', o de "Ladri di Bicicletti" ou "Umberto D"] ou, anos mais tarde, noutro momento absolutamente sublime de Comédia, em "I Soliti Ignoti", uma "paródia crítica" ao "Rififi" de Jules Dassin, baseado num "polar" de Auguste Le Breton, uma hoje clássica "epopeia do fracasso", em cuja [sub...] versão italiana faz um magistral 'Dante Cruciani', "professor de gatunos, retirado" absolutamente irresistível.
Na imagem acima republicada, Tótó surge ao lado de Eduardo Di Filippo cujas semelhanças fisionómicas [para além de um certo tipo de comicidade contida e não-imediatamente aparente comum a ambos] com o actor português Manuel Santos Carvalho são, de facto, notáveis.
Memórias que vais desenterrar e que as tuas palavras enriquecem ! Fico cheia de vontade de voltar a ver estes filmes há tanto tempo esquecidos!
ResponderEliminarUm beijo, Carlos.
Alguns foram, de facto, momentos notáveis de Cinema, Ana!
ResponderEliminarNão por acaso, sobreviveram estes anos todos, inclusive às condicionantes políticas hoje-por-hoje muito pouco recomendáveis...
Um beijinho, também, Ana!
Bons feriados!
Carklos